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terça-feira, 27 de março de 2012

Sorrisos e Lágrimas

Segunda-feira, 26 de março de 2012, cansaço mental e físico, raiva, preguiça, mau humor, dor de cabeça, ressaca moral e a derradeira e mórbida perspectiva que mais uma semana de vida vai-se embora sentado numa mesa, com o ar condicionado glacial fodendo com o meu sistema respiratório. Nada de novo.

Eu voltava pra casa de metrô, tentando me decidir entre um suicídio dramático na estação, um atentado terrorista ou ir pra casa comer uma janta requentada em frente ao computador. Optei pela última opção, para o azar do Brasil Urgente.
Na plataforma numero 4 da estação Brás, eu esperava o trem chegar  enquanto flertava com a idéia de ir direto pra cama ao chegar em casa, sem nem dizer boa noite.
Um vagão vai parando devagar na minha frente, olho pela janela e confirmo minhas suspeitas: todos os bancos estavam ocupados. Entro no trem como quem entra num velório, dou uma rápida olhada no ambiente e avalio minhas opções. Ando mais um pouco em direção ao fundo do pau-de-arara e me sento no chão junto com os outros derrotados.

Totalmente imerso em meus pensamentos e na voz de Ian Curtis sussurrando tristeza e genialidade, eu me esqueci por um momento de onde eu estava. Aos poucos fui tomando consciência das coisas ao meu redor e no meio daquele mar de rostos cansados e apáticos, deparei-me com uma garota muito bonita, absorta olhando através do vidro, aparentemente sem ver nada além da escuridão do lado de fora. Peguei-me olhando fixamente pra ela pelo que me pareceu ser uma eternidade. Algo em seu rosto, além da beleza, me chamou a atenção e a minha genuína curiosidade não me deixou desviar o olhar.

A moça saiu de seu transe por um instante e pegou o celular de dentro da bolsa pra mudar a musica. De repente, sem se dar conta dos olhos postos em cima dela ou talvez sem se importar com eles, ela chorou. Uma torrente de lágrimas escorria pelo seu rosto, deixando no caminho um fino borrão na maquiagem. Eu não saberia explicar meus motivos, mas não vi tristeza naquele pranto. Talvez pelo meu estado emocional, carente por coisas inusitadas e belas, fiquei admirando aquilo sentindo algo que já não se limitava à curiosidade.

As pessoas aos poucos se deram conta da situação, olhavam de soslaio para não deixar a moça sem graça e depois voltavam a fingir que nada acontecia, só eu me mantive firme sem saber bem o motivo. Por um momento fugaz nossos olhos se cruzaram e, contrariando as minhas próprias expectativas, não me embaracei e sustentei o olhar.
Ficamos ali, por um segundo infinito, nos fitando com mutua incredulidade até que ela me abriu um sorriso tão lindo e sincero que eu não pude deixar de retribuir.

Senti minhas mãos suando e meu coração batendo mais rápido de uma forma tão assustadoramente forte que eu devo ter deixado transparecer numa feição de satisfação e surpresa agradável que o momento me proporcionou. Com um gesto quase que automático, passei de leve a mão sob meus olhos e senti meus dedos úmidos: uma lágrima descia tímida pela minha bochecha direita. Achei aquilo engraçado e a moça riu junto comigo, se levantou e, por um momento eu tive a esperança de que estivesse vindo em minha direção, mas ela se dirigiu à porta e saiu depois de me lançar um último olhar e acenar de leve com a mão livre. Acenei de volta e a vi se afastando, com seus passos convictos e seu cabelo liso balançando de um lado pro outro, livres.

Só depois de tê-la perdido de vista é que me dei conta que ainda estava dentro de um trem cheio de gente me olhando com cara de paisagem. Não me importei. Enquanto eu saia da estação, ziguezagueando pela multidão, eu só conseguia pensar naquela moça e no que aquilo tudo tinha significado. Não cheguei à conclusão nenhuma, mas tinha certeza de que eu precisava transformar essa experiência em algo que valesse a pena ler, como forma de honrar a inspiração que ela me deu.

Não tive coragem de perguntar o motivo do choro da moça, porém as circunstanciais me fizeram crer (ou minha imaginação me convenceu) que a musica que ela ouvia lhe trousse alguma boa lembrança. Gosto de pensar que esse foi um momento único, na minha vida e na dela, e que provavelmente ela não vai me esquecer tão cedo assim como eu não vou esquecê-la.

Segunda-feira, 26 de março de 2012. Tudo diferente.


Obrigado, desconhecida, pelo teu sorriso.




Cartola - Disfarça e Chora


Achei a canção propícia. Enjoy!




6 comentários:

  1. Bernardo, acho que por algum motivo divino, nós somos amigos. Aconteceu algo parecido comigo esses dias. Eu tava preso no trânsito e, por algum motivo, fiquei olhando em volta as pessoas. Todo mundo sério, falando no celular. Acho que por carência, ou sei la o quê, eu esperava ver algo diferente. E vi!
    Era uma garota bem normal, não era linda. Não estava chorando, mas estava com uma expressão bem triste. Por algum motivo eu sorri e ela sorriu pra mim cara (e parecia sincero).
    Não sei se estou num momento dificil, mas meu dia foi bem melhor depois de ter visto aquele sorriso.
    Pela primeira vez na vida agradeci a Deus pelo trânsito de todo dia!

    E ah, é o Alberto! ahahahaha

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    1. Que foda isso, mano! Agora você sabe muito bem o que foi que eu senti. Fico feliz em saber que alguém tão próximo entende a dimensão do que senti naquela hora. Valeu, mano, abraço!

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  2. Bern, que texto! Fiquei imaginando a cena, as lágrimas e o sorriso. Que lindo! Me emocionei bastante também e lhe digo, suas palavras significaram muito pra mim.

    Te adoro, pretinho.
    Continue escrevendo lindamente assim sempre, viu.

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    1. Valeu, Gabi. A minha intenção era essa mesmo: despertar as pessoa s pra beleza do cotidiano através da minha experiência. Fico feliz que você tenha gostado =]

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